A relao de C. S. Lewis com a morte 2f5f45

Hoje, dia 22 de novembro, comemoramos 53 anos da morte de C.S. Lewis. E vou explicar por que temos razo para comemorar de verdade.

Como se sabe, Lewis foi confrontado com a morte muito cedo, por ocasio do falecimento de sua me vtima de cncer , quando tinha nove anos de idade, em 1908. Isso o deixou muito revoltado com Deus, pois ele, que havia aprendido a fazer suas preces desde cedo no seu lar cristo protestante, havia orado para que Deus a curasse miraculosamente.

Mais tarde, um amigo de guerra tambm morreu no front da Primeira Guerra Mundial. Depois foi a vez do seu pai, quando ele tinha 31 anos de idade e, finalmente, sua amada Joy, que foi a morte mais dolorosa de todas, cujo luto retratado com todas as cores em Anatomia de uma Dor.

Em O Problema do Sofrimento Lewis no escreve diretamente sobre a morte, mas sobre o sofrimento. E o faz sempre numa perspectiva de que haja um sentido maior por trs do sofrimento e que, embora ele seja um mistrio intransponvel para ns, um dia vamos compreend-lo, quando estivermos na eternidade, de onde poderemos olhar para a morte, a partir do outro lado.

Mas ele escreve indiretamente sobre a morte, atravs da linguagem da imaginao, em pelo menos dois momentos das Crnicas de Nrnia. A primeira quando Aslam sacrificado e morto em O Leo, a Feiticeira e o Guarda-Roupa. Depois de ressuscitar, ele explica s meninas Lcia e Susana, que haviam testemunhado a sua morte:

[...] a feiticeira pode conhecer a Magia Profunda, mas no sabe que h outra magia ainda mais profunda. O que ela sabe no vai alm da aurora do tempo. Mas, se tivesse sido capaz de ver um pouco mais longe, de penetrar na escurido e no silncio que reinam antes da aurora do tempo, teria aprendido outro sortilgio. Saberia que, se uma vtima voluntria, inocente de traio, fosse executada no lugar de um traidor, a mesa estalaria e a prpria morte comearia a andar para trs [...]

Ou seja, a morte algo circunstancial, que est envolta em um profundo mistrio e se submete a uma lei inexorvel, que a torna a nica certeza que se pode ter, do ponto de vista da razo humana. Mas do ponto de vista da f, h um outro regime, que extrapola o da magia profunda e que anterior a ela, a chamada magia ainda mais profunda de antes da aura dos tempos, que magia legtima de Aslam.

A outra cena a do final de A ltima Batalha, em que Aslam informa que as crianas morreriam em um acidente de trem. E explica:
Aconteceu mesmo um acidente com o trem explicou Aslam. Seu pai, sua me e todos vocs esto mortos, como se costuma dizer nas Terras Sombrias. Acabaram-se as aulas: chegaram as frias! Acabou-se o sonho: rompeu a manh!
Em outras palavras, a magia de Deus, que vence a morte no apenas mais profunda e anterior magia da Queda e da morte, mas ela mais real e festiva. Trata-se da verdadeira magia, entendida como o sobrenatural. Todo o resto so imitaes baratas e distores. Todo o resto da vida so sombras da glria do que h por vir. E por isso que a perspectiva crist da morte to luminosa e esperanosa: porque, paradoxalmente, ela anuncia a verdadeira vida.

E Lewis parecia prever a prpria morte quando escreveu em uma de suas ltimas cartas a respeito do seu estado de sade:

Imagine-se como sementinha pacientemente hibernando enterrada no solo; espera do afloramento no tempo que o jardineiro achar melhor, para o mundo real, para o verdadeiro despertamento. Suponho que toda a nossa vida presente, quando olharmos para trs, a partir da, no parecer mais, do que um devaneio sonolento. Este o mundo dos sonhos. Mas o galo est para cantar. E est mais prximo agora, do que quando eu comecei a escrever esta carta.

O galo cantou para Lewis e sua carta de despedida resume o sentimento que toda a sua obra desperta em ns: uma profunda saudade no apenas do autor, mas da vida verdadeira que ele est vivendo na eternidade nesse momento. Essa a verdadeira esperana que nos motiva a continuar nossa peregrinao pelo vale da sombra da morte.

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